Tudo começou (ou recomeçou) às vésperas de um Natal a aproximadamente 4 anos.Minha filha me pediu uma bicicleta nova, pois a dela já estava ficando pequena.
Eu, como todo pai zeloso, resolvi comprar uma pra mim também, para poder acompanhá-la nas suas pedaladas e, também, para satisfazer um desejo que já nutria a alguns anos de voltar a pedalar.
Para quem não me conhece, meu nome é Alberto, moro no Rio de Janeiro e tenho 42 anos. Me considero um atleta amador, pois pratico esporte com regularidade desde sempre. Sou montanhista (praticante de Treking, na modalidade não competitiva) a 8 anos.
Muito bem. Comprei 2 bikes. Essas de loja de departamento (Sundow Brisk). Nada caro. Apenas para dar pequenas voltas pelo bairro.
Ledo engano.... Quando dei por mim, já havia sido “picado” pela mosca branca do cicloturismo....
Daquelas duas bikes de loja de departamento, 1 ano depois, só restaram os quadros, pois fui trocando peças, uma atrás da outra e de repente estava com duas bikes de aproximadamente R$3.000,00 cada, só em peças e equipamentos.
Para quem conhece este mundo (das bikes), este valor pode ser irrisório, mas para os meus padrões, isso é muita grana e fruto de muito sacrifício financeiro e algumas brigas com a patroa, que ainda não estava entendendo esta minha nova paixão.
Como já disse anteriormente, sou montanhista e tenho um “irmão” de coração (Sandrão) que é daqueles amigos pra todos os momentos e rapidamente formamos um trio (Eu, minha filha Aline e o Sandão).
Foram dois anos memoráveis. Muitas trips. Muitos km de estrada. Serra, Praia, Campo, enfim; pra onde nossos narizes apontavam, lá estávamos nós na estrada. E sempre saindo da porta de casa. Nada de pegar carro, ônibus, avião, mala-bike, etc. Nada disso. Uma coisa bem amadora e apaixonada mesmo.
Com o passar do tempo, passamos a nos auto-denominar; “CAMELOS DE MOCHILA”, pois ora éramos ciclistas, ora éramos montanhistas.
Este “título” nasceu naturalmente, sem forçar a barra, apenas nasceu da nossa mente e foi ficando.
Até que em Fevereiro de 2007, meu amigo Sandrão leva um tombo de seu camelo (é assim que nós chamamos nossas bikes).
Desses tombos bobos que se leva, sem causa aparente, a apenas 10 km/h. Resultado: Fratura exposta no braço e uma tarde de Pânico no Hospital Souza Aguiar.
Os sábios dizem que os grandes heróis se mostram nos momentos de crise. Foi assim que entrou na nossa vida este excepcional ser humano chamado Fábio Nazareth (Muito Doido, para os mais íntimos). Uma pessoa que “saiu” de um site de relacionamentos (Ciclotur Brasil) para entrar definitivamente em nossas vidas e em nossos corações.
Sem nos conhecer, este cara nos prestou socorro, enquanto todos os outros que estavam no local (havíamos marcado um ponto de encontro, via internet, para um pedal do Rio a Cabo Frio, e estávamos a caminho do local do encontro), foram embora cuidar de suas vidas.
Resgatou os Camelos (desculpem-me, é força do hábito. Não consigo chamar de Bike), nos acompanhou até o hospital, foi visitar o Sandro após a alta médica, nos deu conforto, enfim, foi um grande herói para nós.
Resumindo este drama; o processo de recuperação do Sandro durou mais de 6 meses, a base de muita fisioterapia e esforço.
Até que em Setembro de 2007 marcamos uma nova Trip com os Camelos de Mochila. Desta vez com o Fábio e sem a minha Filha. Iríamos fazer um pedal curto entre Itaipava e Petrópolis. Só para tirar o “Bloqueio” de estrada que o Sandro havia criado e para celebrarmos a sua recuperação.
Mais uma vez, nossos planos foram frustrados.
Um cara embriagado abalroou o meu carro em plena Rio/Petrópolis, fazendo-me perder a direção do veículo e por pouco não capotar na estrada as 5:00hs da manhã.
O carro acabou, porém, os Camelos ficaram intactos nas calhas de teto do meu carro e estávamos sãos e salvos, apesar do susto.
Novamente nosso agora irmão Fábio salvou o dia e achou o motorista embriagado 2 km à frente (ele não parou para prestar socorro), com o seu carro avariado e bêbado como um gambá.
Finalmente, depois de 5 meses do ocorrido, acertamos o tão esperado retorno dos Camelos para o dia 23/02/2008. O roteiro seria Petrópolis/Itaipava/Bonfim, com parada na Cachoeira do Paraíso no Parque Nacional da Serra dos Órgão e um belo almoço a tarde, na entrada do Parque.
Foram 15 dias de expectativa e preparativos. Finalmente estaríamos de volta às pistas. Agora, com o Grupo mais unido ainda e com novos Super Amigos e Irmãos de coração (www.camelosdemochila.blogspor.com).
Marcamos o ponto de encontro as 5:00hs na casa do Alemão, na entrada de Petrópolis e, para tal, eu teria que sair de casa as 3:20hs para pegar 2 amigos em Magé e seguirmos.
Foi uma noite mal dormida.
As 23:30hs desci à garagem, chequei meu camelo, dei aquela tradicional apertada em seus pneus e um tapinha no banco e disse pra ele. “Calma amigo, amanhã já vai chegar”.
A minha postura pode, para alguns parecer meio piegas e até ridícula, mas só quem tem uma relação dessas com a sua bike, vai me entender.
Até um cara velho como eu, ao lado do meu camelo, volto a me sentir um garoto de 14 anos com a sua primeira bicicleta.
Gostava mais dela do que do meu carro e sentiria muito menos se tivessem roubado ele.
Fui deitar as 0:30hs e fiquei rolando na cama até as 2:45hs, quando me levantei, preparei as coisas e desci (moro em um sobrado) animado.
Abri o portão já animado e mentalizando um diálogo com o meu camelo. Abri a porta do carro e quando olhei pra traz, para destrancá-lo (ficava acorrentado a 3 correntes em uma estrutura de vergalhão – daquelas de pendurar xaxim de samambaias) me deparei com um espaço vazio, onde o meu camelo deveria estar.
Fiquei estático. Não acreditei no que estava vendo, deveria ser pegadinha, minha mulher certamente havia colocado meu camelo no terraço só pra me chatear...
Nada disso, haviam furtado meu camelo. Meu companheiro de mais de 4.000km de chão. Meu amigo.
Apenas um objeto. SIM, mas quem nunca teve amor a um brinquedo?
Canalhas, Cachorros Filhos da Puta, Todos eles tem mesmo é que morrer. Este era o meu pensamento momentos após a “ficha ter caído”, pois sei que houve conivência da vizinhança, já que moro em uma área ruim, onde as pessoas que me circundam são muito pobres. Não financeiramente, mas de espírito, de compaixão e de amor ao próximo.
Amigos, a maior pobreza é a cultural.
Logo depois, me veio o consolo, pois minha religião me ensina a tirarmos ensinamentos positivos das adversidades e de procurarmos não vibrar negatividade àqueles que nos fazem o mal.
“Quem sabe este pedal estaria fadado a um acidente?”
“Quem sabe este aparente mal não foi algo menor, para nos poupar de um mal maior ?”
“Quem sabe??????”
Prefiro pensar desta forma e torcer para que meu camelo acabe, de alguma maneira dando muitas alegrias a uma criança ou a um adolescente, pois estou aqui tentando vibrar muito amor ao meu camelo e àquele que esteja com ele, pois quem sabe, a providência divina não faça com que nos esbarremos pelas esquinas da vida?
Quem sabe?????
Certamente que vou montar um outro Camelo. Certamente que ainda vou fazer muitas Trips memoráveis (não se esqueçam que em 2009 tem Caminho da Fé, Camelada).
Mas com certeza, que em todos os bons momentos sobre o novo Camelo, estarei pensando no meu bom e velho Camelão Sinistro, com a minha Caveira no Punho e aquela cara de Vira Latas Valente, me convidando pra ir pra rua.
Fica com Deus amigo, e faça mais um ser humano feliz.
Alberto.
