25 de ago. de 2009

SERRA FINA 2009 - QUINTO DIA




5º Dia – 17/07/2009 – Sexta-Feira – ULTIMO DIA. QUEM DISSE QUE IRIA SER FÁCIL?

Acordamos ainda em tempo de ver o nascer do sol. Posso lhes assegurar que é muito difícil escolher a melhor vista da Serra Fina, pois em todos os picos que pernoitamos, o visual era alucinante.

17/07/09, sexta-feira, 7:07h– Lê, eu e Dinho curtindo o nascer do Sol no Pico dos Três Estados

Quase ninguém conseguiu dormir direito naquela noite, apesar do tempo ter colaborado e o terreno ser bem plano e macio.
Em determinado momento, o Dinho foi a minha barraca pegar alguma coisa e me perguntou se eu havia feito suco. Quando olhei, e a minha garrafa de xixi, que para meu espanto tinha uma urina com um aspecto viscoso e com cor de mostarda.
Fiquei assustado, pois tinha certeza de que aquilo era fruto de quatro dias de racionamento e meus rins já estavam dando sinais de que não iam muito bem.
Vocês se lembram que eu havia me reabastecido com apenas três litros de água no dia anterior?
Pois é. Agora só me restava um litro de água para um dia inteiro de caminhada.
Coloquei-a no meu Camelback e preparei meu equipamento para a partida.


17/07/09, sexta-feira, 8:13h– Levantando acampamento no Pico dos Três Estados para o último dia de caminhada. Observem a ventania, apesar do céu azul. Isso voando é o toldo da minha barraca

Partimos dos Três Estados por volta das 8:30as e seguimos em direção ao Alto dos Ivos.
Teoricamente, pelos relatos anteriores, este dia seria o mais tranqüilo de todos, pois O Ivos seria o último grande pico da travessia e após ele, teríamos só descida e a volta pra casa. MENTIRA !!!
Some-se o cansaço de três dias de caminhada extenuante aliado a um racionamento severo de água, o que proporciona um mal funcionamento generalizado do organismo, além de maximizar a fadiga muscular. Some tudo isso, com o desejo enorme de concluir o desafio. Nesta conjuntura, o quarto dia, pelo menos para mim, pareceu ser o mais duro de todos.
Iniciamos com uma série de descidas e subidas constantes, em direção ao Ivos, com um terreno completamente inóspito. Descidas enormes variando entre pedras, lama, capim de anta e bambuzais.
Chegamos à base do Ivos e encaramos uma subida super-hiper pesada e chegamos ao seu cume por volta das 12:00as. A esta altura do campeonato, minha água havia acabado e ainda nos restavam quase cinco horas de caminhada.


17/07/09, sexta-feira, 11:10h– A caminho do Alto dos Ivos. A saída é por aí...

17/07/09, sexta-feira, 12:38h– Descendo o Alto dos Ivos. Teríamos ainda mais quatro horas de caminhada pela frente


Após chegarmos ao Alto dos Ivos, encaramos uma descida muito difícil e somando-se à falta d'água, que já estava me causando uma desidratação terrível, não fui capaz de fazer mais nenhum registro visual, dado o meu estado de debilidade. Se arrependimento matasse, eu ficaria por lá, mortinho da silva, pois foi justamente aquele único litro de água que eu não abasteci lá no Ruar, que estavam fazendo toda a diferença.
Foi uma pena eu não ter conseguido tirar mais fotos, pois neste ponto do trecho, encaramos os piores bambuzais da travessia. Aqueles que o pessoal diz nos relatos que o montanhista tem que tirar a mochila e rastejar.
Para nossa surpresa, a trilha, neste ponto já está bem batida e, com o passar dos montanhistas, não foi preciso rastejar para vencer o bambuzal, porém a dificuldade foi imensa, pois tínhamos que nos contorcer e agachar a todo o momento para passar por aqueles terríveis bambus que se entrecruzavam como uma teia de aranha em nosso caminho.
Imagine fazer contorcionismo e se agachar depois de quatro dias na montanha, sem água e com mais de 20kg nas costas. A impressão que me dava a todo o momento é que a Serra Fina não queria nos deixar, pois foram muitas as vezes em que, após vencer um obstáculo de bambu, eu me via jogado pra traz por um bambuzinho agarrado à minha mochila, causando aquele efeito do elástico que me jogava para traz como quem diz: “Volta seu corno. Volta que daqui você não sai!”.
Agora vou abrir o último parágrafo deste “breve” rsssss relato para falar da amizade e da solidariedade:
As últimas quatro horas da travessia para mim, foram terríveis, principalmente pela falta de água, que me causou uma desidratação que tirou minhas forças neste trecho.
Eu ia na coluna atrás do Alê, olhando uma garrafinha de Gatorade que ele havia deixado do lado de fora da sua mochila, com uns 300ml de água. Provavelmente era a última água dele. De vez em quando ele sacava daquela garrafinha, caminhando sem parar, e dava aquele precioso golinho.
Aquela visão me dava um desespero terrível e a minha boca parecia que estava cheia de areia. Automaticamente, ao ver aquela cena que se deu repetidas vezes, me dava uma vertigem danada e a vontade era de sentar e ficar por ali mesmo, até que o carro pipa chegasse. Como o carro pipa não iria chegar mesmo, eu seguia em frente, com a boca cheia de areia mesmo.
O Dinho que vinha atrás de mim, notou a minha dificuldade, pois eu não havia falado pra ninguém que a minha água havia acabado, já que o erro havia sido meu em não me abastecer com os quatro litros mínimos de água lá no Ruar. Por isso, eu achava que deveria me punir por isso e não espalhar pra turma.
Mas, amigos se conhecem e aquilo não passou despercebido pelo Dinho. Foi aí que ele, também com pouca água, ficou insistindo para que eu bebesse a água dele, falando:
_ Você ta querendo dar uma de herói cara.
_ Herói morto não tem valor.
_Bebe essa água logo.
_etc, etc, etc.
Pois bem; fiz uso da sua água por três preciosas ocasiões, dando um total de seis goles, que foram a minha salvação.
Não fosse isso, teria problemas ainda maiores. Valeu Dinho. Você é irmão.
De repente e lentamente, a trilha começou a abrir e a vegetação a ficar mais densa, transformando-se gradativamente em uma estradinha apertada e com uma matinha rala, cercada por uma vegetação mais densa.
Encontramos logo uma pequena nascente, e não consigo dizer que nos esbaldamos de tanto beber água. Meus rins, se tivessem boca, estariam gargalhando naquele momento.
Bebi muuuuita água.
Além disso, enchi meu camelback com mais dois litros e termine todo o trecho com aquela mangueirinha conectada à minha boca bebendo e me hidratando. Renasci! Agora eu estava pronto pra fazer a Travessia pelo caminho oposto. Brincadeirinha hehehe.Chegamos finalmente ao Sítio do Pierre. Super bonito, porém abandonado. Parece que aquilo já foi uma pousada, porque tem quadra, uma série de construções e uma piscina seca. Tudo abandonado. Que desperdício.


17/07/09, sexta-feira, 16:00h– Acabamos de chegar ao Sítio do Pierre. Observem que a trilha termina naquele mourão à direita da foto

17/07/09, sexta-feira, 16:02h– Descendo pela estrada que nos levará à Garganta do Registro. Ainda estamos no Sítio do Pierre e são mais 3,5km de caminhada


17/07/09, sexta-feira, 16:20h– A caminho de casa. Aquela Pedra ao Fundo chama-se Pedra do Tucum e foi nosso farol desde o Alto dos Ivos. O Guto disse que este Toten natural, serviu de farol aos primeiros viajantes no período colonial


Ao chegarmos à porteira do Sítio do Pierre, único local aonde vimos sinal de humanos, havia uma casinha pequena parecendo-se a casa dos caseiros. Lá havia duas crianças bonitinhas que nos receberam com um largo sorriso perguntando se gostaríamos de tirar uma foto deles. Tiramos a foto, e para nossa surpresa, o garotinho (era um casal) foi na direção do Alê pedindo o pagamento pela foto, que foi prontamente atendido com um saquinho de amendoim. É mole? Mercantilismo na Serra Fina.Eles eram profissionais e queriam nos explorar. O moleque estava cobrando pedágio. Hehehe
17/07/09, sexta-feira, 16:48ah. Naporteira do Sítio do Pierre encontramos estas duas gracinhas que queriam nos cobrar por esta foto

17/07/09, sexta-feira, 16:55h– Alegria, alegria. Acabamos de encontrar o nosso resgate na Garganta do Registro. O Celso (nosso motorista) já estava nos esperando desde as 15:00as, com aquela paciência de mineirinho. Forrou um paninho na grama e deu aquele cochilo até a nossa chegada


17/07/09, sexta-feira, 16:59h. Fim deuma aventura inesquecível que deixará saudades. Eu e meu amigo e irmão Dinho, nos preparando para entrar na Kombi


17/07/09, sexta-feira, 21:59h– Comemoração merecida, regada a pizza e vinho no Hotel Serra Azul. Vitória e muita história para contar.


Depois foi só comemorar, com um demorado banho quente, um Prato Feito caprichado na Pensão da Filó em Passa Quatro e pizza e vinho com um bom bate papo a noite no Hotel Serra Azul.
O dia seguinte foi todo reservado para o retorno cansativo pra casa.
É isso amigos. Espero que este “breve” relato atenda a expectativa do pessoal que teve a paciência de esperar por exatos 30 dias para que eu tivesse tempo de escrevê-lo.
Agradeço a Deus por ter nos protegido durante toda a excursão, permitindo que a semana transcorresse na maior harmonia e segurança, sem que ninguém sofresse nenhuma lesão grave, pois foram muitas as possibilidades de acidentes na Serra.
Agradeço a minha esposa e minhas filhas que tiveram a paciência de me esperar por seis dias em casa, sem saber se eu estava bem e tocando a rotina doméstica enquanto eu estava aproveitando a natureza.Não vou me esquecer disso e darei a compensação assim que for possível
Agradeço aos meus amigos que me acompanharam nesta excursão, pela solidariedade, companheirismo e principalmente paciência, durante os meus rompantes de síndrome da “chefite” aguda. Em alguns momentos eu passo dos limites. Mas peço que vocês mais novos relevem este meu excesso. É tudo levado pela preocupação com a segurança de vocês. Coisas de velho mesmo.
Agradeço aos amigos Camelos de Mochila, que não foram conosco, mas ficaram aqui torcendo muito pelo nosso sucesso. Mesmo que por interesse, pois assim poderemos guiá-los com segurança no ano que vem. Não é Oteb? Kkkkkkkkkkk
Um agradecimento especial ao Fábio (Muito Doido). Amigo sincero das horas difíceis, por sua dedicação e companheirismo. Sempre pronto a ajudar e me resgatar na rodoviária, depois de uma semana intensa nas montanhas.
Para finalizar este “Brrrrrrrrrrreeeeeve” relato, gostaria de transcrever duas mensagens para meus queridos e pacientes leitores amigos, extraídos do livro Deus Contigo de Cesar Braga Said:


“Valorize suas amizades oferecendo aos amigos o calor da sua presença.
Visite-os quando possível, telefone, escreva uma carta, mande um recado, demonstrando o quanto você se importa com eles.
Não espere pelas ocasiões especiais para externar o seu carinho. Torne especiais e únicos todos os momentos ao lado deles.
Abrace ainda hoje alguém e deixe transparecer toda a alegria de estar ao lado dessa pessoa.”

“Solte o pássaro da alegria que está engaiolado em seu peito, privado da alegria de cantar e de voar.
Descubra o mar profundo do seu coração, onde se escondem tesouros capazes de torná-lo muito feliz.
Vislumbre o céu azul que existe em sua consciência, sem que você já o tenha divisado.
Trabalhe as dimensões do seu ser que ainda não foram despertadas. Encontre prazer em desvendar seu mundo íntimo.
Ilumine seu rosto com um sorriso e, clareando os caminhos com a sua própria luz, contagie os que se acercarem de você com a sua alegria de viver”



Abraços Fraternos.

Alberto Monte

6 comentários:

George Arcanjo disse...

Caraca! Muito show. Este relato deveria ser divulgado para odos que pretendem fazer esta travessia para ver como é. Demais. Valeu Alberto.

Alberto Monte disse...

Obrigado pelo comentário Arcanjo.
Vamos ver se ano que vem reunimos uma turma maior.
Quem sabe você vai conosco. Abraço.

Márcio C. disse...

Mano, isso que é montanhismo, o resto é tentativa, rsrsrsrs. Uma verdadeira saga. Nível de dificuldade relatada impressionante. Estou na expectativa de tentar no ano que vem, 2010, essa travessia, com certeza é uns dos mais detalhados relatos sobre uma das mais dificeis travessias do país. Parabéns a toda a equipe. Por mais difícil que seja, tentarei fazer ela em menos dias, que DEUS nos ajude quando formos. Valeu.

Alberto Monte disse...

Valeu Márcio.
Realmente foi muito Show esta travessia.
Ano que vem deveremos retornar lá com um grupo maior.
Espero que você tenha sucesso na sua tentativa.

Unknown disse...

Parabéns pelo relato galera.
Assim como vocês, eu e meu grupo vamos para o terceiro ano de "desejo" para fazer a travessia de Serra Fina. A logística é o nosso maior problema, ano após ano.
Talvez em abril vamos concretizar esse objetivo no feriado do dia 21.
Um abraço aos mochileiros e visite nosso site: www.psychokillers.com.br

Thiago BDI.

ALBERTO disse...

Valeu Thiago.

Desejo a você boa sorte na sua empreitada.

Apesar de Abril ainda não ser uma época propícia para fazer a Serra Fina.